quarta-feira, 2 de junho de 2010

À garota "dois cookies"

Hoje é dia trinta de maio, um domingo, e ontem, em algum instante entre pegar o ônibus e o início da aula de canto, eu parei para comprar cookies, e por alguma razão, eu estava feliz. E só estar feliz não me bastava, eu queria inserir felicidade em transeuntes. Talvez eu tenha conseguido. Foi com a mulher do caixa. Não que eu tenha feito algo especial, eu só fui a Luiza que eu queria ser no momento e fiquei indecisa entre um cookie e um brownie. Este bem pretinho e crocante, e aquele macio, de baunilha, com gotinhas escuras. Pedi-lhe conselho e a vi responder, indubitavelmente:
-Um cookie. -  Decidi:
-Um cookie.
Ela riu. E voltou com algo inusitado. Eu indaguei:
-Dois cookies?
Ela levou o dedo indicador aos lábios e sibilou. Eu sorri e saí andando. E ainda estou pensando. Ela sabia que tinha cometido um pequeno erro de matemática, que tinha feito 1+1=2, ao invés de, sei lá, 1=1 e ponto. Ela sabia, eu sei e agora nós duas temos um segredo, que divido contigo apenas por confiar muito em você.
E vou refletir.
Sabe o que as pessoas costumam fazer? Elas costumam pensar que são apenas um ser, que se resumem a um nome e a uma existência. Que não são nada senão elas mesmas. Mas não é bem assim.
Quando temos um caminho a seguir, um destino certo, costumamos nos firmar nele, traçamos uma linha reta e não olhamos para os lados, para não dispersar o futuro. É como se a vida fosse um corredor extenso medido, não em metros, mas em segundos. Só paramos para olhar para os lados na hora de atravessar a rua, e, se partirmos do princípio de que o fazemos para manter a vida que já levávamos, desviar o olhar aqui nada mais é do que continuar olhando para frente. É com essa desatensão que trombamos nas pessoas.
Acontece que pessoas não são feitas pra trombarmos nelas. Viver não é caminhar ou correr por uma estrada. Viver é estender trilhas para facilitar os caminhos e poder, assim, olhar em volta para dar sentido a borboletas e zangões. E também não somos seres singulares, igualitários. É tão mais bonito ser sem solidão. Sejamos todos uma soma, e caminhemos unidos para a vida, que, só, nos espera, sentada em uma árvore, e a qual podemos perder ao não reconhecer a totalidade de nossas existências, ou ao desmentir miragens.
A garota "dois cookies" foi essencial, não por ter melhorado a situação da glicose em meu corpo, e sim por ter-se deixado tocar por minha felicidade, por ter me mostrado o leque de boas possibilidades com que a sociedade se abana. As coisas pequenas rumam os dias unicamente, e, transformando tudo isso em dados, um "não" demora desesseis "sins" para recuperar um alguém. Logo, a diferença de quem tu és não parte do que o mundo fez de ti, e sim do que estás fazendo de tuas orbitações em torno da Terra.
Então é tudo mais ou menos assim: mude o mundo se ele o incomoda. Sorria. Ganhe cookies (no plural). Passe em frente a um mendigo numa manhã fria, cumprimente-o, deseje-lhe bom dia e deixe com ele aquela barrinha de chocolate escondida em sua bolsa. Gosto de pensar que é assim que tudo devia funcionar.
Sabe, minha professora de inglês perguntou-me o que eu estava fazendo pelo mundo. O questionamento tinha inclinação ecológica, e meus pensamentos tenderam para outro rumo no decorrer da semana. No fundo talvez eu não atente tanto para o lixo-reciclável quanto para o ser sensível interno a todos nós. Você, leitor-que-já-deve-estar-farto-de-tanta-baboseira, insira isso em seus próximos segundos da maneira que quiser, mas, por favor, pare um pouco.
Pare, e acredite que em algum canto sujo existe uma criança chorando. Em algum dia frio existe um sem-teto orando. Em algum desespero existe uma mãe tentando sorrir. Em alguma poluição existe a vegetação atrofiando. Em alguma mesa branca eu já existi escrevendo isso. Em algum segundo vil está você. E você, como está?

by Luiza Borba (foxy lady)

ps: este é um fragmento de algo que estou escrevendo, não é um diário, mas são meus dias em narração. Bom... um dia eu descubro tudo isso melhor. Até mais.